Sumário: Em tempos de austeridade, e em nome de uma pretensa igualdade de tratamento fiscal dos rendimentos de capitais, desagrava-se a tributação dos rendimentos prediais, ao mesmo tempo que se agrava a tributação dos rendimentos do trabalho, em claro desvio dos Princípios Constitucionais sobre a tributação do rendimento. Da pretensa igualdade fiscal, chegou-se à iniquidade fiscal. É tempo de lembrar as velhas liberdades ibéricas, de que Santo Isidoro de Sevilha foi percursor, e de apearmos o Governo injusto!
I – A Proposta
de Lei n.º 103/XII/2.ª, que aprova o Orçamento de Estado para 2013, vem
alterar a tributação dos rendimentos prediais. Até agora, os rendimentos
prediais eram englobados para efeitos de IRS, isto é, eram considerados,
deduzidos os encargos com manutenção e IMI, na totalidade dos rendimentos a
tributar, sendo por isso taxados da mesma forma que os rendimentos do trabalho.
Os restantes rendimentos de
capital, designadamente juros, rendimentos de valores mobiliários (acções,
obrigações, etc.), eram tributados até aqui com taxas liberatórias (artigo
71.º do CIRS), ou no caso das mais valias, com taxas especiais (artigo
72.º CIRS), ambas actualmente fixadas em 25%.
Ora, verifica-se um tratamento
desigual entre rendimentos de capital, que a Proposta de Lei n.º 103/XII/2.ª
procura resolver, aplicando também taxas especiais aos rendimentos prediais,
fixando-se a generalidade das taxas liberatórias/taxas especiais em 28,5% em
tal proposta. E isto, claro, mantendo a possibilidade de englobamento destes
rendimentos, o que será sem dúvida feito quando fiscalmente mais favorável.
Assim, e aparentemente, esta
proposta vem em defesa da igualdade de tratamento fiscal. Mas a verdade é que
apenas vem em defesa da igualdade de tratamento fiscal entre rendimentos de
capital...
II - A exigência de
progressividade dos imposto sobre os rendimentos, esbarra, quanto aos
rendimentos de capital, nas mágicas taxas liberatórias e especiais de 28,5%.
Ora, já no que tange aos rendimentos do trabalho e de pensões, estas taxas
podem atingir 48%, fora as sobretaxas!
Podemos assim concluir, que por
mais que se receba, a título de rendimentos de capitais e rendimentos prediais,
apenas se pagará a taxa de 28,5%, apenas cerca de mais de 5% da taxa média
aplicável a quem aufere exclusivamente de rendimentos de trabalho entre € 7 000
e € 20 000/ano, e menos 1,8% do que aqueles que aufiram, a título de
rendimentos de trabalho, mais de € 20 000 até € 40 000/ano.
E é aqui, que de uma medida que
pretensamente pretende estabelecer a igualdade de tratamento fiscal, passamos a
uma medida que acentua a iniquidade fiscal. Trata-se, sem dúvida de um
tratamento brutalmente desigual entre rendimentos do trabalho e pensões e
rendimentos de capital.
A Constituição da República
Portuguesa, no artigo 104.º, n.º 1, prescreve, em matéria de impostos sobre o
rendimento: “O imposto sobre o rendimento pessoal visa a diminuição das
desigualdades, e será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os
rendimentos do agregado familiar.”.
Importa dizer que nem todos
pensam como o Governo, e expressam bem as suas diferenças de opinião. O Bloco
de Esquerda apresentou o Projecto
de Lei n.º 300/XII/2.ª, que visa, no actual regime, englobar o rendimento
das mais valias em sede de IRS.
III – O modo de encarar a
tributação dos rendimentos de capitais e prediais pelo Governo, especialmente
quando comparado com o tratamento dos rendimentos do trabalho, é claramente
revelador dos seus propósitos: desequilibrar as relações entre trabalho e
capital, em favor deste, também pela via fiscal.
Agravam a tributação do trabalho
e, candidamente, e em nome de uma pretensa igualdade fiscal, desgrava-se a
tributação dos rendimentos prediais.
De resto, isto não constitui
novidade, quanto às posições de princípio deste Governo nestas matérias:
veja-se a tentativa indecente de transferir, do capital para o trabalho uma parte
substancial da Taxa Social Única.
Muitos outros exemplos de
iniquidade fiscal se podiam apontar a este Governo, mas julgo que este é
emblemático.
Como diria Santo Isidoro de
Sevilha, citado por Paulo Ferreira da Cunha em “Para uma História do Direito Constitucional Português”, Almedina,
Coimbra, 1995, pág. 110: “Rex eris si recta facis, si non facias non
eris”. Esta é a tese da legitimidade do poder, também pelo seu
exercício com justiça, que fundou as liberdades ibéricas. Ainda nas palavras de
paulo Ferreira da Cunha, ibidem pág. 111, “Em plena Idade Média, enquanto outros Povos
gemiam sob o peso do poder absoluto, impúnhamos à nossa monarquia a forma
condicional: o Rei governará se for digno de governar (…)”. Lembremos este
legado histórico!
E por este exemplo, o Governo
perdeu toda a sua legitimidade. É chegado o momento de os apearmos!
Ventosa, 16 de Outubro de 2012
Rui Costa
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