domingo, 29 de janeiro de 2012

"Por uma sociedade à Esquerda", 13 anos depois (I Parte)

Sumário: Em 21 de Janeiro de 1999, enquanto militante do Partido Socialista, apresentei uma moção sectorial ao XI Congresso Nacional. Em conversa com amigos, veio à baila este escrito, que se encontra ainda disponível on line, e cuja oportunidade em 1999 está cabalmente demonstrada. Com efeito, muitos dos problemas abordados revelam uma grande actualidade, e merecem reflexão, atento o estado a que chegámos. De então até hoje, deixei o Partido Socialista e passei, a partir de 2010, a militar no Bloco de Esquerda. Politicamente terei mudado de opinião? Verificava-se então, ou agora, incoerência entre o meu pensamento e a minha militância partidária? Estas são questões que poderão ter uma multiplicidade de respostas, dependendo do prisma de quem faça a análise. Num momento em que o PS chegou a este ponto e o BE debate internamente, julguei oportuno republicar este texto, corrigindo algumas gralhas, e intercalando, 13 anos depois, algumas anotações e reflexões pessoais. Pela extensão sua extensão, este documento será dividido em várias partes. Nesta primeira parte, farei uma introdução e enquadramento, publicando a primeira parte da moção, em que abordo os mass media e a globalização e os seus efeitos na democracia e na economia.


I - Fez 13 anos, a 21 de Janeiro de 2012, que apresentei uma moção sectorial ao XI Congresso Nacional do PS, com o título “Por uma sociedade à Esquerda”. Casualmente, em conversa com amigos, lembrei-me deste texto, que consegui obter online (pág. 22 e ss.), na página do órgão oficial do Partido Socialista, o “Acção Socialista”.



De 1994 a 2009 militei na Juventude Socialista e no Partido Socialista, tendo desempenhado funções concelhias, distritais e nacionais nos órgãos da JS e do PS. Na JS fui candidato a Secretário-Geral, no XI Congresso Nacional, em 1998, em que perdi para Sérgio Sousa Pinto. Integrei os Secretariados Nacionais da JS, com Jamila Madeira como Secretária-Geral e fui membro da Comissão Nacional do PS de 1998 a 2004 e da Comissão Política Nacional do PS entre 2002 e 2004.



Pelo meio, fui candidato pelo PS a Presidente da Câmara Municipal de S. Pedro do Sul, em 2001, num cenário bem adverso, pois o PS tinha perdido a Câmara Municipal, pouco mais de um ano antes, na sequência de graves desentendimentos internos.



Nessa ocasião, muitos me tentaram demover, e ainda hoje me censuram por um acto que foi entendido como “hari kiri” político. Muitos me disseram “vais queimar-te”, “não é o teu momento”, “a oportunidade não é a melhor” ou “só nos devemos candidatar quando tivermos hipóteses de ganhar”… Em vão o disseram!



Para mim, a actividade política implica participação e a defesa franca dos nossos pontos de vista, das nossas convicções. Implica liberdade e firmeza nas opiniões emitidas! Considerações de outra ordem remetem-nos, invariavelmente, para a política que tanto é criticada: para o carreirismo, para o oportunismo e para a incoerência.



Em 2003, fui o principal autor de do Projecto de Revisão Constitucional n.º 5/IX, subscrito pela deputada à Assembleia da República e Secretária-Geral da JS, Jamila Madeira.



Com a demissão de Ferro Rodrigues, apoiei a candidatura de Manuel Alegre a Secretário-Geral do PS, eleição que perdeu para José Sócrates.



O período de liderança de José Sócrates foi o culminar de um processo de descaracterização ideológica do PS, que se tornou numa máquina de poder, conformada com a necessidade de gerir e conservar o exercício do poder político. Assim, o PS sacrificou a defesa dos mais desfavorecidos e dos trabalhadores no altar dos mercados e do euro. E também sacrificou princípios em prol da imagem junto da imprensa.



O consulado de José Sócrates descaracterizou definitivamente o PS, e eu fui-me afastando até que, em Julho de 2009 me desfiliei do PS.



Ainda em 2009, viria a ser cabeça de lista do BE à Assembleia Municipal de S. Pedro do Sul, tendo a lista eleito dois elementos, facto inédito para um partido não pertencente ao centrão desde 1985. Mais tarde, em 2010, filiei-me no Bloco de Esquerda, sendo cabeça de lista em Junho de 2011, pelo Bloco de Esquerda, no círculo eleitoral de Viseu.



Desta breve nota biográfica resulta que nem sempre fui um vencedor. Nem sequer o quis. Preferi, e prefiro, continuar a ser um livre-pensador, mesmo que mais não ganhe com isso que a satisfação de ter feito algo, e de ter sido leal aos meus princípios.



II – A releitura, 13 anos depois, da moção “Por uma sociedade à Esquerda” deu-me imenso prazer, em primeiro lugar por reencontrar o meu pensamento político de há tanto tempo, e em segundo lugar por me permitir elaborar uma reflexão crítica sobre o seu teor.



A moção aborda temas interessantes, como sejam a influência descontrolada e opaca dos media na formação da opinião pública e nas decisões dos partidos políticos, a liberalização do comércio internacional e os perigos do dumping social e ambiental, as limitações às políticas sociais decorrentes da moeda única europeia (que então ainda não circulava) e a necessidade de desenvolver mecanismos de Democracia Participativa.



Verifico que, em muito, que o seu conteúdo se mantém actual, o que significa que em muitos dos temas tratados não tivemos, enquanto sociedade, a capacidade de concretizar e responder a alguns dos desafios aí lançados. Em outras situações, volvidos 13 anos, verificam-se verdadeiras surpresas, como é o caso da evolução das relações entre Países Desenvolvidos e Países em Vias de Desenvolvimento.



O formato dos Congressos do Partido Socialista inviabilizou a discussão e votação desta moção em Congresso. Por decisão do Congresso, foi a competência para a sua discussão e votação delegada na Comissão Nacional do PS a eleger. Por sua vez, a Comissão Nacional do PS eleita, entendeu transformar todas as moções sectoriais em recomendações ao Secretariado Nacional do PS.



Este modelo de debate, se assim se pode chamar, caracterizou durante anos o PS, e contribuiu para a degradação do debate interno, para o silenciamento das críticas de fundo, servindo a estratégia de quem preferiu transformar o PS numa máquina eleitoral, num partido espectáculo. O PS e a Esquerda, pagarão essa factura durante largos anos.



A versão impressa no suplemento do “Acção Socialista” está em letra de tamanho muito pequeno, e apresenta imensas gralhas, que aproveito para corrigir. Assim, apresento-vos o texto original da moção, com a correcção das gralhas detectadas, e que segue, integralmente, em itálico.



Já a reflexão e análise crítica, volvidos estes 13 anos, será intercalada, através de notas, no respectivo texto. Optei por não se rever o texto, mesmo quando ele revele erros científicos ou de análise. São esses erros fruto de uma menor maturidade do autor, que à data tinha 20 anos. Fazem parte do processo de aprendizagem, e não podem ser apagados.





“Moção Sectorial ao XI Congresso Nacional do Partido Socialista

(Publicada no Suplemento do “Acção Socialista”, de 4 de Fevereiro de 1999)





POR UMA SOCIEDADE À ESQUERDA



A rápida mutação do Mundo iniciada na década passada e especialmente visível na nossa década lança grandes desafios às formações políticas de Esquerda, que deverão readaptar

o seu discurso à nova situação mundial.



Os subscritores desta Moção, mais do que criar uma doutrina política, vêem como objectivo lançar intenso debate no seio do Partido Socialista e da sociedade em geral sobre os desafios que se colocam à Esquerda no novo milénio.



A ascensão do Neo-Liberalismo



A hipertrofia do Estado e a incapacidade momentânea de resposta dos modelos económicos Keynesianos e do Estado Providência às crises petrolíferas dos anos 70 e 80, abriram caminho à propagação das doutrinas económicas neo-liberais, que se apresentaram como soluções de resposta a essas crises económicas.



Exemplos paradigmáticos da aplicação política da doutrina económica neo-liberal são o “Reaganomics” norte-americano ou o “Thatcherismo” britânico. O primeiro exemplo leva a uma maior abstenção económica do Estado e a esforços no sentido da liberalização mundial do comércio. O segundo exemplo, assenta na redução do Sector Empresarial do Estado e na sua intervenção mínima na economia, e é o modelo que influenciará toda a Europa, onde a intervenção estatal sempre foi superior aos mínimos exigidos pelo “American way of life”.



O advento do pragmatismo político associado às correntes neo-liberais desde logo contribuiu para uma séria tentativa de esvaziamento ideológico, para o qual foi ainda determinante a queda do Comunismo no Bloco de Leste. Tornou-se frequente que os media veiculassem a voz corrente da esmagadora maioria dos “opinion makers”, advogando o fim das ideologias, o esbatimento ou até mesmo o fim do antagonismo Esquerda/Direita.



Esta tentativa de introduzir uma espécie de pensamento único ou pensamento dominante deu os seus frutos, patentes na “Terceira Via” britânica ou no “Novo Centro” teutónico.



Nota: A terceira via e o novo centro foram realidades que politicamente já pereceram nos seus países de origem, em função do afastamento do poder do Labour e do SPD. No entanto, esta espécie de “neo-liberalismo” gerado em barriga de aluguer dos velhos partidos socialistas, sociais-democratas e trabalhistas fez escola, e permitiu até a descaracterização, em Itália, dos Democratas de Esquerda, agora apenas Democratas, herdeiros do velho PCI. Por cá, Sócrates e o PS sob a sua liderança, foram justos representantes desta realidade. A verdade é que os partidos sociais-democratas, socialistas e trabalhistas não resistiram à força da liberalização dos mercados, não conseguindo encontrar uma acção comum, no plano internacional e europeu, para contrariar essa voracidade e selvajaria.



Uma informação globalizada, cidadão informado?



A “Aldeia Global” e o desenvolvimento dos media, em especial da televisão, levou o indivíduo ao isolamento no seu lar, reduzindo-se assustadoramente as formas de convívio e debate com elementos exteriores ao agregado familiar. Este debate, invariavelmente politizado levava a uma maior pluralidade na análise da informação, hoje maioritariamente reduzida à visão veiculada pela imprensa escrita e televisiva.



Assim, com uma menor actividade de discussão política, o cidadão vê-se permeabilizado relativamente à informação que recebe pela imprensa. É natural que sendo propriedade de empresas privadas haja uma necessidade de realizar lucro, recorrendo a imprensa frequentemente ao sensacionalismo e à superficialidade da informação. Este facto nada teria de grave se os receptores da informação comportassem espírito crítico. Mas a realidade, é que cada vez são menos críticos.



Naturalmente que o objectivo “sensacionalismo” é gerido cuidadosamente pela imprensa, havendo situações de flagrante manipulação. A associação de interesses entre os proprietários dos “Mass Media” e grupos de influência política conduz muitas vezes a uma guerra sem quartel, com a denúncia de escândalos que visam a classe política, muitas vezes hiperbolizados e manipulados.



Nada melhor para acentuar a descrença do cidadão na política. Os “Mass Media” assumem assim um papel relevante e mais que influente junto da opinião pública. O grande problema reside na concentração económica de que são alvo, estando assim manipulados em função dos interesses dos seus proprietários, quase sempre ligados à política e quase sempre religiosamente Neo-Liberais, como de resto a maioria dos empresários.



Os próprios Partidos Políticos pautam a sua actuação pela acção da imprensa, dada a influência detida junto da opinião pública. O artificialismo do discurso e a sua convergência para os critérios do pensamento único Neo-Liberal são verdadeiramente assustadores. Mais uma vez lembramos a actuação do Labour ou do SPD.



Nota: Os media continuam a ter grande peso na formação da opinião pública, havendo quem se lhes refira como o “Quarto Poder”. Mesmo com o notável desenvolvimento das redes sociais, desde a data de escrita da moção, a verdade é que muitas delas se limitam a reproduzir os conteúdos fornecidos pelos media. Ora, o carácter privado dos mesmos e o respectivo poder, impõe a construção de um regime jurídico que vise evitar e diminuir a concentração económica da respectiva titularidade, em nome da pluralidade, e um regime que exija maior publicidade dos respectivos titulares do capital social, em nome da transparência.



Como já então se afirmava no texto da moção o poder dos media é tal, que os próprios agentes políticos submetem a sua actuação à conveniência dos media.



Igualmente desigualitário é o acesso ao exercício da liberdade de expressão nos media. A selecção de comentadores e articulistas de opinião permite uma a manipulação clara da opinião pública, sendo o exercício do contraditório condicionado pelas próprias opções dos responsáveis pelos meios de comunicação social. Tal tem gerado, a meu ver, um evidente desequilíbrio a favor dos alinhados com o neo-liberalismo. É uma das formas que encontro para explicar toda esta passividade quanto ao ataque feroz aos direitos da classe média, justificados com a inevitabilidade da crise.



Este “Quarto Poder”, desprovido de qualquer legitimidade democrática, e cuja legitimidade constitucional baseada na liberdade de expressão não é acompanhada por uma igualdade no acesso à divulgação de informação, é, quanto à forma de regulação, um dos fenómenos de maior interesse para o desenvolvimento das democracias. De “opinion makers” poderão passar com facilidade a “rule makers”.



A este propósito, é muito curiosa uma já antiga abordagem ao fenómeno do insuspeito Rogério Ehrdart Soares, in Direito Público e Sociedade Técnica, Edições Tecnacitas, Coimbra, 2008 (versão correspondente à 1.º Edição, Atlêntida, Coimbra, 1969)”, página 82: “Quer dizer que, assim como tinha caído a base económica da construção política burguesa – uma teia de produtores autónomos e tendencialmente iguais, fazendo parte de um mercado sem constrangimentos – assim também deixa de corresponder à realidade a sua base cultural, - uma sociedade de homens livres, livremente informados, e determinando-se espiritualmente por um conjunto de experiências e pontos de vista pessoais, conseguidos no seio de uma intimidade sem contactos com a tirania do económico.”



É, assim, bom de ver o efeito dos media na qualidade da democracia!



Uma economia globalizada, um mundo desequilibrado e de conflitos sociais.



Nesta conjuntura política vivida na última década, por pressão dos EUA e do Japão, intensificaram-se esforços com vista à liberalização do comércio e da prestação de serviços. Em consequência dos esforços desenvolvidos por estes países foram concluídos e assinados os acordos que instituem a Organização Mundial do Comércio (OMC), num quadro ultra-liberalizante do comércio internacional.



Com este regime, tornou-se mais atractivo para as empresas multinacionais transferirem muitas das suas unidades de produção para os Países em Vias de Desenvolvimento (PVD’s), em especial aquelas que não necessitam de mão-de-obra muito qualificada. Os elevados custos de mão-de-obra nos Países Desenvolvidos (PD’s), que comportam elevadas contribuições para os sistemas de Segurança Social, bem como uma regulamentação laboral muito favorável aos trabalhadores, que é inexistente nos PVD’s foram factores determinantes para este movimento.



Mais, a protecção ambiental imposta nos PD’s afectou a actividade industrial, impondo-lhe uma regulamentação exigente em matéria de protecção ambiental. A protecção ambiental é ainda incipiente nos PVD’s, que se tornam assim atractivos para a transferência das indústrias poluentes.



A inexistência de regimes democráticos consolidados e a fraca organização do movimento sindical e ambiental, bem como as dificuldades económicas desses países, facilitam assim o acesso às multinacionais.



Tudo isto poderia ser aceitável numa perspectiva de desenvolvimento integrado e sustentado dos PVD’s. Infelizmente, tal não sucede. Apesar de a actividade económica desenvolvida pelas multinacionais nesses países gerar emprego, a política das multinacionais é totalmente alheia à melhoria das condições de vida das populações, não havendo qualquer desenvolvimento em matéria salarial, social ou laboral que não seja estritamente necessário para a manutenção do “status quo”.



A estratégia das multinacionais é assim uma exploração desenfreada dos “PVD’s”, num novo colonialismo, sem contornos de domínio político directo, um colonialismo essencialmente de contornos económicos. O que não deixa de ter as repercussões na actividade política destes países, muitas vezes condicionada pelos interesses das multinacionais.



Os efeitos dos usuais contratos de investimento que usualmente são assinados entre a multinacional e o Estado receptor da unidade de produção são quase sempre inconsequentes pela sua relação com os lucros da empresa no país, que são manietados por técnicas de fuga fiscal como a simultânea subfacturação de exportações e sobrefacturação de importações.



Se as consequências para os PVD.s são, como vimos, negativas, a tensão social provocada por este movimento de internacionalização da economia não deixa incólumes os PD’s. Os PD’s só se tornam competitivos com uma redução dos custos de produção das empresas, o que as força a optar pela automatização do processo produtivo, em detrimento do factor produtivo mão-de-obra, encarecido pelos pesados encargos sociais e pela forte regulamentação laboral. Naturalmente que em nome da competitividade das empresas e das economias dos PD’s se sacrifica um elevado número de postos de trabalho, causando as altas taxas de desemprego que flagelam os PD’s.



Outra consequência deste facto é a pressão das empresas para a flexibilização da regulamentação laboral nos PD’s, sempre em nome da competitividade, prejudicando assim as conquistas dos trabalhadores feitas ao longo de décadas, em nome da sua dignidade, segurança e estabilidade, em nome da justiça laboral. O Partido Socialista, bem como os seus parceiros da Internacional Socialista sempre estiveram na primeira linha da defesa dos direitos laborais, não podendo assistir impávidos a esta tentativa de retrocesso.



A tensão social aumenta assim nos PD’s, como é patente nas manifestações sindicais a que assistimos nos últimos anos, sendo o exemplo francês paradigmático. A incapacidade de resolução deste problema acentua a descredibilização do sistema político.



Mas nem só os movimentos sindicais actuam. A extrema-direita tem explorado este fenómeno da forma que mais lhe aproveita. A intensificação das manifestações de intolerantes de racismo e xenofobia atestam-no, como por exemplo em França, com a Front National, ou na Alemanha, com o crescente movimento Neo-Nazi. A própria extrema-direita mais subtil tem apelado aos valores do nacionalismo contra o movimento de globalização da economia, apontado como a causa da crise.



Por último, e não menos preocupante, a concentração do poder económico. O fenómeno de globalização da economia é acompanhado da concentração económica em grandes grupos empresariais, cuja extensão, poder e influência tornam mais difícil o seu controlo pelas entidades públicas. Os processos de concentração a que nos referimos tendem à criação de monopólios privados e oligopólios, dificultando assim o acesso ao mercado por novos agentes económicos e aliciando à cartelização do mercado, com consequências ao nível da formação de preços. Mesmo para um Neo-Liberal é clara e preocupante esta situação.



Nota: Esta parte da moção foi fortemente influenciada pelo estudo e leitura de uma série de obras sobre o comércio mundial e dos então recentes acordos GATT/OMC.



Ao longo do primeiro lustro da década de 2000, assistiu-se à proliferação de uma série de movimentos, de fundamentos ideológicos diversos (nem sempre claramente identificáveis), que iam da extrema-direita à extrema-esquerda, passando por movimentos ruralistas e religiosos, e que contestavam o fenómeno da globalização.



Estes fenómenos já haviam sido experimentados no Século XIX, com o movimento liberalizador do comércio internacional, e motivou várias críticas, de List a Marx (ver a este propósito dois interessantes textos de Karl Marx, in Crítica do nacionalismo económico, Antígona, Lisboa, 2009).



Na moção, foquei essencialmente as questões relacionadas com a prática de “Dumping Social” e “Dumping Ambiental”, em especial nos efeitos de pressão que previsivelmente iriam ter nas regalias e nível salarial e sobre o modelo do Estado Social dos Países Desenvolvidos. E como se vê, com razão. No entanto, é curioso que as grandes manifestações de desagrado são levadas por movimentos de extrema-direita, em relação aos imigrantes. É como se apontando para a Lua, se insistisse em olhar para a ponta do dedo.



Já os efeitos do crescimento económico dos PVD’s nas dívidas externas, nas dívidas soberanas e nas estruturas de capitais das multinacionais, tradicionalmente sedeadas nos PD’s não foram abordados na moção: a verdade é que a acumulação de saldos positivos das balanças de pagamentos de alguns PVD’s, os converteram em credores dos PD’s, e até mesmo proprietários de empresas tradicionalmente ocidentais.



Com estas observações não se pretende negar o direito ao desenvolvimento dos PVD’s. Pretende-se, isso sim, que num mercado liberalizado, se criem condições que permitam uma concorrência leal entre os países no comércio internacional, por um lado, e que se criem condições para o desenvolvimento de melhores condições laborais e ambientais nos PVD’s.



De outra forma, este processo de Globalização não será uma oportunidade de desenvolvimento harmonioso da Humanidade, mas sim um processo de desconstrução dos Direitos Humanos!

(Continua)

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